O
pacto entre Stalin e Hitler não foi acordo espúrio a fim de dar tempo para a URSS preparar-se ap ataque nazista, como
defendem apologistas do estalinismo. Era Trotsky e a Oposição de Esquerda Internacional
que propunham a inevitabilidade daquela agressão, desde inícios dos anos 1930.
E eram acusados, por isso, pelos estalinistas, de fomentarem a guerra entre os
dois países.
Stalin
e a direção estalinista acreditavam no respeito por Hitler e pelo nazismo do
pacto de não agressão que dividiu a Polônia e abriu as portas à Segunda Guerra
Mundial. Um fato da vida quotidiana da
URSS estalinista registra esse breve amor profundo de Stalin, jamais
correspondido por Hitler, amante insincero, sinistro e ardiloso, que sempre
soube que a URSS era seu maior inimigo.
Margarete
Thüring estudou para professora primária, aderiu à Juventude Comunista Alemã e,
em 1926, com 25 anos, ao Partido Comunista Alemão. Casou-se com Rafael Buber,
ativo camarada de origem judaica, com quem teve duas filhas, separando-se
devido ao fato do companheiro se afastar do comunismo. Por sua militância,
perdeu a guarda das filhas, em 1928, entregues aos sogros, judeus praticantes.
UM
JOVEM CAMARADA
Margarete
casou-se a seguir com Heinz Neumann, fundador e alto dirigente do PCA, diretor-chefe do periódico comunista Bandeira
Vermelha (Rote Flame), também ativo quadro da Internacional Comunista. Heinz
Neumann caiu em “desgraça”, em 1932, por opor-se à política estalinista para a
Alemanha, que subestimava o perigo nazista. A mesma posição defendida, então,
pela Oposição de Esquerda Internacional [trotskista]. O casal foi enviado em
missão à Espanha e, devido à conquista nazista do governo, em 1933, se radicou
em Moscou, em 1935.
Em
27 de abril de 1937, durante o “Grande Terror”, Heinz Neumann foi preso,
julgado, condenado à morte e executado no mesmo dia, talvez com o tradicional
tiro na nuca. Tinha então 35 anos. Em junho de 1938, foi a vez de Margarete
Buber-Neumann. Acusada de atividades contra-revolucionários [trotskistas],
foi condenada a longos anos de trabalhos
forçados penosos em campos de concentração estalinistas. É também possível que
sua condenação tenha se devido ao fato de ser esposa do alto dirigente
comunista, com tradição crítica, com quem debateria as questões políticas
alemãs, soviéticas e internacionais.
BEIJO
MACABRO DOS NOIVOS
Após
o noivado e o casamento Stalin-Hitler, os noivos trocaram presentes logicamente
sinistros. Em 1940, Stalin entregou de presente aos nazistas os comunistas
alemães presos nas prisões estalinistas. Entre eles, Margarete, extraditada
sobre a ponte de Brest-Litovsk, na atual Bielorússia, e enviada ao campo de
concentração feminino de Ravensbrück, noventa quilômetros ao norte de Berlim. O
mesmo em que estava aprisionada Olga Benário, também comunista alemã, de origem
judia, entregue aos nazistas pela polícia política de Getúlio Vargas, com a
gentil cooperação do STF da época. Margarete teve melhor sorte que Olga.
Em
abril de 1945, com a aproximação do Exército Vermelho, prisioneiras do campo de
Ravensbrück foram deixadas em liberdade. Então, Margarete empreendeu viagem a
pé, através da Alemanha, procurando
refúgio entre familiares, na Baviera, e se esforçando para não cair nas
mãos do Exército Soviético, onde a NKVD era ativa. Temia ser reenviada aos
campos de concentração estalinistas, sorte que coube a grande número de
comunistas libertados das prisões ou que sobreviveram a repressão nazistas,
entre eles, o célebre Leopold Trepper, comunista polonês de origem judaica,
organizador da maior rede de espionagem comunista na Europa Ocidental,
conhecido como a “Orquestra Vermelha”. Após a guerra, permaneceria em campo de
prisioneiro estalinista, por nove anos, mesmo após a morte de Stalin, em 1953!
Após
a guerra, Margarete Buber-Neumann assumiu viés político conservador e, a
seguir, anti-comunista. O que de se lamentar, mas compreensível. Entre outros,
escreveu dois importantes livros de memórias sobre seus anos nos campos de
concentração estalinistas e nazistas:
Milena, editado no Brasil, e Sob dois ditadores: prisioneiros de Stalin
e Hitler [tradução livre], inédito em português.
Mário Maestri*
Professor da UPF - Universidade de Passo Fundo
*Com a colaboração da linguista italiana Florence Carboni
*Com a colaboração da linguista italiana Florence Carboni