Benedito Guimarães Aguiar Neto foi indicado pelo governo de
extrema direita de Jair Bolsonaro, para presidir a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes do Ministério da Educação
– MEC, sob a direção de Abraham Weintraub.
Benedito é cristão protestante, tendo sido reitor da Universidade Presbiteriana
Mackenzie. Só para lembrar, em abril de 2019, a Reitoria da Mackenzie decidiu
censurar a participação das editoras Boitempo e Contracorrente na Feira de
Livros organizada pelo Centro Acadêmico João Mendes Jr, em São Paulo.
Além do
direitismo a direção da Mackenzie incentiva ostensivamente o obscurantismo
sobre um verniz científico. Já foram realizados vários simpósios internacionais
“Darwinismo Hoje” (2008, 2009, 2010 e 2012) para fazer propaganda do denominado
“criacionismo científico” e desacreditar a Teoria da Evolução. Para
consolidar essa perspectiva, nos
dias 05 e 06/05/2017, foi lançado o Discovery-Mackenzie, um núcleo de pesquisas sobre ciência,
fé e sociedade, com o objetivo de promover estudos científicos focados em
complexidade e informação na busca de evidências que apontem para a ação de um
design inteligente na natureza. Como o nome indica, o núcleo conta com parceria do Discovery Institute, organização estadunidense dedicada à
chamada “Teoria do Design Inteligente”. Segundo a pseudociência do “Design
Inteligente” os processos naturais são incapazes de explicarem a diversidade
biológica, entre outras coisas, devido à falácia da “complexidade irredutível”
que exigiria a presença de inteligência sobrenatural. Interessante que os
defensores do “Design Inteligente”, não publicam artigos em revistas sérias,
não testam hipóteses e não fazem ciência. De fato, é uma reciclagem do
criacionismo próprio do velho fundamentalismo cristão protestante, geralmente
associado a posturas conservadoras e reacionárias.
É típico de qualquer fundamentalismo religioso, seja ele católico,
protestante, mulçumano ou hindu, uma atitude política antimoderna e uma
insensibilidade à crítica da razão.
O fundamentalismo protestante surgiu como uma reação ao
liberalismo ou modernismo teológico que se desenvolveu no século XIX em
resposta ao avanço das ciências e do movimento dos trabalhadores, com uma
reflexão teológica aberta às ciências e às conquistas da razão moderna. Nesse
sentido, conforme Oro (1996), teólogos e igrejas liberais estabeleceram
coordenadas progressistas como: 1) aceitação das teorias das ciências naturais
como o darwinismo; 2) a teoria das fontes ou crítica bíblica; 3) a influências
das religiões dos povos vizinhos nas tradições do judaísmo primitivo; 4) a
teoria da revelação progressiva; 5) aceitação do naturalismo como explicação do
mundo, diminuindo o espaço para a interpretação sobrenatural; 6) entendimento
da deturpação do cristianismo primitivo e, 7) aceitação de técnicas e métodos
provenientes das ciências históricas, sociais e naturais no estudo da Bíblia e
de seus manuscritos, o que refletiu profundamente na reflexão teológica. No mesmo
contexto histórico, Kautsky (2010), indica a presença de teólogos e pastores no
movimento socialista alemão no fim do século XIX e início do século XX.
Como expressão mediada da luta de classes, em especial na
sociedade estadunidense o protestantismo dividiu-se em dois campos básicos:
conservador e liberal. Os liberais vinculavam-se mais à solidariedade, a uma
opção política, à primazia do interesse público e à justiça social. Já os conservadores
desprezavam temas sociopolíticos, centrando-se na defesa da “livre empresa”, do
bem individual e do sucesso econômico como sinais de salvação baseados numa
moral comum privada, individual e familiar.
No seio do campo conservador o vocábulo “fundamentalismo” surgiu,
em 1895, numa conferência bíblica em Niágara, onde foram fixados os cinco
pontos do fundamentalismo bíblico: 1) inerrância verbal da Sagrada Escritura;
2) divindade de Jesus Cristo; 3) o nascimento virginal de Maria; 4) a teoria
substitutiva da redenção e, 5) a ressureição corpórea de Jesus com seu retorno
no final dos tempos. Com essas coordenadas desenvolveu-se uma literatura exegética
e teológica, de uma perspectiva sociopolítica conservadora, para combater o
secularismo e o liberalismo.
Nas diversas fases de desenvolvimento do fundamentalismo um
dos centros de sua atividade foi o combate incessante às conquistas científicas
de Charles Darwin, por contrariar a verdade bíblica, além de confrontar-se com todo
sistema científico que não aceitasse a leitura literal da Bíblia. Associados a
essa postura anticientífica estão a defesa da família patriarcal, da hierarquia
social, do poder ilimitado do clero sobre as comunidades religiosas, do
anti-ecumenismo, do preconceito diante da diversidade humana e do apoio a correntes
políticas autoritárias. O fundamentalismo é multidenominacional e, depois da
Segunda Guerra Mundial, foi um dos pilares do anticomunismo nos Estados Unidos.
Houve, por exemplo, uma convergência entre a política externa estadunidense e a
expansão de várias correntes religiosas no contexto de ascensão de lutas
populares na América Latina, de acordo com Lima (1991).
Diante do exposto, a indicação de um criacionista para gerir
a Capes não é algo aleatório. A corrente fundamentalista cristã protestante é
uma das vertentes que compõem o amálgama sociopolítico do governo de extrema
direita de Bolsonaro. Essa vertente clerical reacionária pró-imperialista e
anticomunista é cúmplice dos ataques aos trabalhadores, à economia nacional, às
mulheres, aos indígenas, aos negros, à juventude e aos LGBTs.
Como, afirma Stanley (2018), uma das características da
extrema direita, desde Mussolini e Hitler, é o anti-intelectualismo. A extrema
direita não só desconfia, mas odeia a razão e o pensamento científico. Daí a
confluência entre o governo neofacista de Bolsonaro e o fundamentalismo para
destruir a universidade pública e o pensamento crítico no Brasil.
Somente uma frente única, com ampla liberdade de crença e de
consciência, em defesa da ciência, da
pesquisa, do pensamento crítico, da escola pública e da democratização do
conhecimento poderá deter essa barbárie neofascista e fundamentamentalista.
Frederico Costa
Professor da UECE - Universidade Estadual do Ceará
Diretor do Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual do Ceará – SINDUECE/ANDES-SN
Coordenador do Instituto de Estudos e Pesquisas do Movimento Operário-IMO
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Diretor do Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual do Ceará – SINDUECE/ANDES-SN
Coordenador do Instituto de Estudos e Pesquisas do Movimento Operário-IMO
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Referências Bibliográficas
KAUTSKY,
Karl. A origem do cristianismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2010.
ORO,
Pedro Ivo. O outro é o demônio: uma análise sociológica do
fundamentalismo. São Paulo: Paulus, 1996.
LIMA,
Délcio Monteiro de. Os demônios descem do Norte. Rio de Janeiro: Editora
Francisco Alves S.A., 1991.
STANLEY,
Jason. Como funciona o fascismo: a política “NÓS” e “ELES”. Porto
Alegre: L&PM, 2018.