Antes de mais nada, somos um ser
natural. Este dado óbvio tem se mostrado muito visível ao mundo desde quando a
China anunciou, em dezembro de 2019, o aumento de doenças respiratórias nas pessoas
sem saber identificar a doença.
Pouco mais de 3 meses, além do nome
– COVID-19 –, como foi nomeada esta doença, o fato é que ainda se sabe muito pouco
sobre ela. Apesar de os cientistas estarem buscando criar uma vacina para sua
cura, a única certeza até o momento é que ainda teremos longos meses de espera.
Enquanto isso, a única saída imediata encontrada por alguns países como China,
Itália e Espanha – apenas para situar alguns dos mais atingidos pela pandemia
–, tem sido o isolamento social. Não obstante, alguns países como os Estados
Unidos[1] e o
Brasil[2]
relutaram/relutam em aceitar este fato irrefutável.
A adoção do isolamento social acaba
demonstrando o ponto de partida do constructo teórico de Marx: somos um ser
natural, condição ineliminável de todo ser biológico e, ao mesmo tempo, um ser
social. Portanto, sendo o vírus de natureza biológica, qualquer medida para
combatê-lo só pode se efetuar no âmbito das relações sociais.
Ocorre, porém, que alguns países
terão mais êxito que outros, a depender de diversas circunstâncias estruturais,
sociais e políticas, cujas implicações incidem sobre as medidas adotadas, a
agilidade nos processos de prevenção e tratamento, entre outros. Mas isto é
apenas parte da questão e, mesmo assim, tem resultado em muita polêmica, a
exemplo do Brasil.
O presidente Bolsonaro, ao
qualificar a COVID-19 de “gripezinha”, além de demonstrar o seu total desprezo
pela ciência e seus representantes, dentre os quais, ainda que no limite das
contradições, figuram a Organização Mundial da Saúde (OMS) e os órgãos
nacionais de saúde, tem contribuído para que a população se mantenha mal informada.
Como resultado, ao invés de os indivíduos buscarem se proteger da contaminação
epidêmica a partir das orientações baseadas no conhecimento científico, acabam se
guiando por determinadas crenças que, de modo geral, encontram respaldo na
perspectiva ideológica bolsonarista. Enganam-se totalmente aqueles que
acreditam que a concepção defendida por Bolsonaro está associada à fé em Deus.
Sua fé inabalável está no mais poderoso deus da atualidade: o capital!
Assim como ocorreu nas grandes
guerras mundiais em que muitas pessoas morreram, a pandemia –, embora não possa
ser confundida com uma guerra –, segue ceifando muitas vidas: afinal, em pouco
mais de 3 meses, já contabiliza uma cifra mundial que só tende a aumentar a
cada dia, com mais de 4 milhões de contagiados e quase trezentas mil mortes![3]
Além da vida, isto é, da condição
natural de existência humana, a pandemia coloca em questão, ao mesmo tempo, a
existência social, isto é, a manutenção das sociedades. Isto porque o único
“remédio” encontrado até o momento para evitar um aumento maior da proliferação
da COVID-19 tem sido o isolamento dos indivíduos. Mas isto tem uma consequência
imediata: um enorme impacto na economia mundial.
Assim, com o fechamento dos mais
diversos setores da economia, o mundo capitalista, que funciona a partir da
lógica da compra e venda de mercadorias, se vê mergulhado num poço profundo de
endividamento, recessão, aumento do desemprego,[4] da fome,
atingindo sobretudo parcela considerável da população pobre e os trabalhadores.
A situação é ainda pior para os países
que já estavam atravessando sérias dificuldades, com suas medidas de contenção
e aumento de corte nas políticas públicas em setores como a educação, a saúde,
entre outros.
E, como se fosse obra de um
fenômeno da natureza, a mídia e os representantes do capital acabaram por dar
forma à expressão crise do coronavirus que, a meu juízo, constitui um
total equívoco: como é possível a crise de um vírus?
Trata-se, na verdade, da crise do
capital que já vinha sendo anunciada bem antes do surgimento da COVID-19 pois,
conforme Martins,[5] “desde o ano passado a
economia mundial já apresentava grave quadro de pletora do capital. Em setembro
de 2019, já se podiam fazer outras observações acerca de um pavoroso estado estacionário da economia”.
Marx, na sua investigação sobre a
reprodução do capital, tornou-se pioneiro na elaboração de uma teoria da crise,
enfatizando o seu caráter cíclico.
Gorender (1996, p. 57), na
Apresentação de O capital, assinala que a função das crises cíclicas
consiste em recuperar, momentaneamente, o equilíbrio do modo de produção
capitalista:
As crises cíclicas cumprem a função precípua de recuperação passageira do equilíbrio do sistema capitalista, justamente por haver sua tendência ao desequilíbrio atingido um grau paroxístico. Mas este equilíbrio momentâneo só se efetiva mediante tremenda devastação das forças produtivas até então acumuladas. Devastação manifestada na depreciação das mercadorias ou simplesmente na destruição dos estoques invendáveis, no surgimento de alto grau de capacidade ociosa nas empresas, na falência de muitas delas e sua absorção por outras a preço vil, na desvalorização geral do capital e, por fim, no desemprego maciço, que inutiliza grande parte da força produtiva humana e reconstitui, em proporções maiores, o exército industrial de reserva. (GORENDER, 1996, p. 57).
Mas o equilíbrio no modo de
produção capitalista é apenas passageiro e não permanente, já que a tendência ao
desequilíbrio faz parte da natureza do capital. Como diz Marx (1996, p. 112),
“a produção capitalista move-se através de determinados ciclos periódicos.
Passa por fases de calma, de animação crescente, de prosperidade, de
superprodução, de crise e de estagnação”.
Analisando o processo de crise na
grande indústria, Marx (1996, p. 83), afirma que:
A enorme capacidade de expansão aos saltos do sistema fabril e sua dependência do mercado mundial produzem necessariamente produção febril e consequente saturação dos mercados, cuja contração provoca estagnação. A vida da indústria se transforma numa sequência de períodos de vitalidade média, prosperidade, superprodução, crise e estagnação.
Assim, passada a prosperidade, vem
a estagnação, anunciando a retomada da crise, com todas as suas consequências:
A insegurança e a instabilidade a que a produção mecanizada submete a ocupação e, com isso, a situação de vida dos trabalhadores tornam-se normais com essas oscilações periódicas do ciclo industrial. Descontados os tempos de prosperidade, impera entre os capitalistas a mais intensa luta em torno de sua participação individual no mercado. Essa participação está em relação direta com a barateza do produto. Além dessa rivalidade, produzida por esse fato, no uso de maquinaria aperfeiçoada, que substitui a força de trabalho, e de novos métodos de produção, surge toda vez um ponto em que o barateamento da mercadoria é buscado mediante diminuição forçada dos salários abaixo do valor da força de trabalho. (MARX, 1996, p. 83).
Marx (1996, p. 283) assinala que para
obter a “recuperação passageira do equilíbrio do sistema capitalista”, é
necessária uma “tremenda devastação das forças produtivas”, mediante algumas
medidas como a “depreciação das mercadorias”, isto é, a destruição dos estoques
invendáveis”, a falência de muitas empresas, a elevação do desemprego, que
inutiliza grande parte da força de trabalho e a criação, em maiores proporções,
do exército industrial de reserva ou superpopulação relativa:
O curso de vida característico da indústria moderna, sob a forma de um ciclo decenal, interrompido por oscilações menores, de vitalidade média, produção a todo vapor, crise e estagnação, repousa na contínua constituição, na maior ou menor absorção e na reconstituição do exército industrial de reserva ou superpopulação. Por sua vez, as oscilações do ciclo industrial recrutam a superpopulação e tornam-se os mais enérgicos agentes de sua reprodução. (MARX, 1996, p. 263).
A crise do capital desde cedo se revela
no modo de produção capitalista, em 1825, no período entre 1820 a 1830, quando
a grande indústria “começava a sair da sua infância”, como afirma Marx (1996,
p. 135). Segundo o autor (1996, p. 135), em 1830 “começou a crise que se
tornou, de uma vez por todas, decisiva”.
A crise de 1846/47 trouxe
consequências devastadoras para a classe trabalhadora, conforme o Relatório de
Inspetores (Rep. of Insp. of Fact. 31st Oct. 1848. p. 16) citado
por Marx:
´Deve-se lembrar que, em consequência da terrível crise de 1846/47, reinava muita miséria entre os trabalhadores fabris, pois muitas fábricas trabalhavam apenas em tempo reduzido e outras estavam totalmente paralisadas. Considerável número de trabalhadores encontrava-se sob forte pressão, muitos endividados. Podia-se por isso admitir, com razoável certeza, que prefeririam um tempo de trabalho mais longo, para se refazer das perdas sofridas, talvez pagar dívidas ou resgatar seus móveis da casa de penhores ou substituir haveres vendidos ou prover de roupas a si mesmos e a suas famílias´. (MARX, 1996, p. 397).
Marx (1996, p. 355) adverte que
embora com a crise se dê uma interrupção na produção, não significa dizer que
desapareça o prolongamento da jornada de trabalho pois, “Quanto menos negócios
são feitos, tanto maior deve ser o ganho sobre o negócio feito. Quanto menos
tempo pode ser trabalhado, tanto mais tempo excedente de trabalho deve ser
trabalhado”. E, fazendo referência à crise de 1857 a 1858, demonstra a questão
com base nos relatos dos inspetores de fábrica:
‘Pode-se considerar uma inconsequência que qualquer sobretrabalho seja realizado num tempo em que o comércio vá tão mal, porém a má conjuntura incita pessoas inescrupulosas a praticarem transgressões; assegura-se assim um lucro extra.’ [...] ‘Ao mesmo tempo’, diz Leonard Horner, ’que 122 fábricas em meu distrito encerraram suas atividades, 143 estão paradas e todas as outras trabalham com tempo reduzido, prossegue-se com o sobretrabalho além do tempo legalmente determinado’. ‘Embora’, diz o sr. Howell, ‘na maioria das fábricas, em virtude da má conjuntura dos negócios, só se trabalhe meio período, continuo a receber, depois como antes, o mesmo número de queixas de que 1/2 hora ou 3/4 de hora são furtados (snatched) diariamente aos trabalhadores por meio de incursões nos prazos que lhes são legalmente assegurados para as refeições e descanso’. (MARX, 1996, p. 355).
A crise de 1866, de acordo com
alguns dados extraídos de um jornal londrino por Marx, trouxe sérias consequências,
conforme o relato:
‘[…] Rememoremos o que sofre essa população. Ela morre de fome. Esse é o fato simples e terrível. Há 40 mil deles. [...] Em nossa presença, num bairro dessa maravilhosa metrópole bem ao lado da mais imensa acumulação de riqueza que o mundo já viu — bem junto a ela estão 40 mil pessoas sem auxílio, morrendo de fome! Esses milhares irrompem agora em outros bairros; meio mortos de fome em todas as épocas eles gritam sua miséria em nossos ouvidos, clamam aos céus, falam-nos de suas habitações atingidas pela miséria, dizem que lhes é impossível achar trabalho e que é inútil pedir esmolas. Os contribuintes locais do imposto para os pobres estão sendo, eles mesmos, arrastados pelos encargos paroquiais para a beira do pauperismo’ (Standard, 5 de abril de 1867.). (MARX, 1996, p. 300).
Como observa Marx (1996, p. 297), a
crise afeta, inclusive, “até mesmo a parte mais bem remunerada da classe
trabalhadora, sua aristocracia”. Portanto, toda a classe trabalhadora é atingida
pela crise do capital.
Engels (1996, p. 154), comentando
sobre a crise ao longo do período entre 1825 a 1867, no Prefácio da edição
inglesa de O capital, afirma que a estagnação, a prosperidade e a
superprodução, são traços contínuos no sistema do capital.
Se perguntarmos o que mudou dos
tempos de Marx para cá, responderemos que em relação à essência do capital nada
foi absolutamente modificado: continua existindo a exploração do trabalho, a
contradição entre capital e trabalho, a desigualdade social e o aumento da
riqueza em contraposição ao aumento de pobreza.
Mészáros, na obra Para além do
capital (2002), afirma que a partir dos anos de 1970, o modo de produção capitalista
adquire uma nova característica: ao invés das crises cíclicas tal como Marx concebia,
temos agora uma crise estrutural, que é mais profunda, extrapolando as esferas
particulares e atingindo um caráter universal de modo a determinar todos os
ramos da produção. Além disso, tem um alcance mundial, não se limitando a
alguns países. Diferente das crises cíclicas, sua escala temporal é permanente
e se desenvolve de maneira progressiva, com probabilidade de ocorrerem colapsos
futuros, na medida em que se esgotem as estratégias de contenção da crise e o deslocamento
temporário das contradições.
Os limites absolutos do capital
preconizados por Marx e resgatados por Mészáros (2002) mais uma vez se
comprovam na realidade.
A Covid-19 atingiu quase todos os
países e acabou transformando-se numa ameaça real capaz de abalar ao extremo os
pilares de uma estrutura socioeconômica de abrangência universal: o sistema do
capital. Ou seja, diante do combate ao coronavirus, impõe-se a necessidade de
parar o complexo processo que mantém o sistema do capital: a produção, a compra
e a venda de mercadorias, o consumo!
Emerge, a partir daí, um dilema
crucial: a escolha pela manutenção/defesa da vida ou do capital, cuja decisão,
no atual momento da luta de classes, está nas mãos dos dirigentes do Estado burguês,
os presidentes dos países, e dos grandes capitalistas.
Dirigentes dos mais diversos países
têm se posicionado por uma ou por outra alternativa. Contudo, é necessário
esclarecer que mesmo aqueles que se posicionaram em defesa da vida, mediante a
adoção de medidas preventivas como o isolamento social e a definição de
políticas sociais, isto não significa dizer que a prioridade ontológica passou
a ser os seres humanos, em detrimento da secundarização do capital.
Nem mesmo na aparência é possível
admitir a possibilidade de uma mudança radical nas convicções e ações destes
dirigentes ou, como diz Mészáros (2000), personificações do capital. Isto se
explica porque faz parte da natureza de sua função administrar o capital e seus
órgãos legais de sustentação compostos pelo Estado burguês.
Mesmo que se trate de governos relativamente
progressistas, com a adoção de uma política estatal eficiente, competente e
mais comprometida com a população, a imperativa manifestação da contradição
entre capital e trabalho não desaparece. O Estado exerce o poder político sob a
mirada e o comando absolutos do capital.
Isto não significa dizer que não
exista diferença entre uns e outros; a posição de países como China, Itália,
Espanha, Alemanha, França, entre outros, em concordância com os órgãos de saúde
em relação à pandemia, difere significativamente daquela defendida pelos
governos de extrema direita vigentes no Brasil e nos Estados Unidos.
No entanto, apesar das medidas de
confinamento como meio de preservação da vida e de políticas sociais no
enfrentamento da situação adotados por diversos países, o capital impõe limites
à ação política de maneira incontestável.
A interrupção no movimento cíclico
do capital, ainda que seja em caráter emergencial, representa um avanço
descendente nos lucros, tanto quanto avança a pandemia. E como o sistema não
pode, por si só, ser destruído, o período de isolamento da população concedido
pelo poder público encontra-se limitado às determinações do processo de
reprodução capitalista.
Na Espanha, por exemplo, o governo
decretou o “Estado de Alarma” em 15 de março, determinando o isolamento
social; no dia 30, prorrogou o confinamento para o dia 9 de abril. E, antes
mesmo de cumprir este último prazo, prorrogou o isolamento social pela terceira
vez, desta vez para o dia 26 de abril, mas autorizando o retorno, entre outros,
dos trabalhadores de atividades como a construção civil e a indústria, que
estavam parados.[6] A Itália, por exemplo, sem
que ainda tivesse conseguido controlar a pandemia, já começava a se preparar para
voltar à normalidade a partir de 3 de maio.
As consequências causadas na
interrupção do movimento cíclico do capital são tão trágicas para a
sobrevivência do processo vital do capital que, mesmo estando cientes dos
riscos de um retorno (rebrote) da Covid-19,[7] os
países se veem obrigados a retroceder. Afinal, estamos no mundo das mercadorias
e elas precisam ser produzidas, vendidas e consumidas!
A capacidade de recursos que os países
ricos têm a seu dispor no enfrentamento ao coronavirus é muito superior aos
países pobres e, ainda assim, nenhum destes países tem sido capaz de oferecer
uma total proteção e segurança nem aos próprios trabalhadores do sistema de
saúde,[8] que
são os da linha de frente nesta pandemia, e muito menos à população de maneira
geral.
Como o sistema do capital é movido
pela produção de mercadorias com o objetivo do lucro, por meio da exploração do
trabalho, num momento como este, coisas simples como máscara, luvas, álcool,
entre outros equipamentos de proteção, e até mesmo água, passam a ser muito valiosas.
E, embora se trate de coisas tão simples, os países capitalistas, com todo o
seu desenvolvimento tecnológico, não foram capazes de colocar todo o seu
sistema produtivo a serviço da produção daqueles bens necessários visando à
proteção da população.
Se o mundo não fosse comandado pelo
capital e existisse uma forma de sociedade em que o trabalho estivesse voltado
para a produção de valores de uso,[9] certamente
a defesa da vida seria efetivamente uma prioridade. E assim, diante de toda a tecnologia
e conhecimento existentes, em poucos dias esta pandemia estaria superada. Todo
o processo de produção estaria voltado para a defesa da vida, para produzir as
condições necessárias à manutenção da vida.
Porém, para que uma sociedade com
esta forma de trabalho possa existir, é necessário que os trabalhadores, únicos
interessados na superação da exploração, como já dizia Marx, estejam convictos
da necessidade de transformar o mundo.
De vários cantos do mundo têm
surgido, no campo do debate marxista, algumas reflexões sobre o momento atual.
E o que mais chama a atenção, nestas análises, é que embora façam a crítica ao
modelo atual, acabam apresentando alternativas que consistem numa melhor
planificação da economia, colocando-a a serviço da sociedade, a nacionalização
da saúde, o não pagamento da dívida, a criação de um poder popular, entre
outros. São alternativas que, semelhantes ao que se deu nas experiências que
buscaram a transformação social, a exemplo da Rússia, não atingem o objetivo,
ficando limitadas às condições objetivas do capital. Mas, verdade seja dita: os
revolucionários russos tinham um projeto de sociedade claramente definido, um
objetivo nítido, que era a construção de uma sociedade socialista.
Os projetos de sociedade atualmente
apresentados têm se limitado, em sua grande maioria, de ponta a ponta do mundo,
às reformas do capital e à transformação do Estado, colocando-o a serviço da
sociedade. Como se existisse a possibilidade de o Estado transformar o capital e
assim, passar a atuar em prol da humanidade!
Porém, a centralidade ontológica
não está na esfera da política, por mais que insista o pensamento predominante,
até mesmo no campo do marxismo. A história de todas as sociedades demonstrou que
enquanto não ocorrer uma mudança substantiva na forma de trabalho, não é
possível uma mudança essencial de seu modo de produção e, com ele, da
sociedade.
Uma das principais lições que a pandemia
nos deixa é a certeza de que num mundo comandado pelo capital, regido pela ganância
do lucro, a vida humana jamais será prioritária. Entre salvar vidas e manter o
ciclo reprodutivo do capital, não há dúvidas: a escolha será sempre pela
manutenção do capitalismo.
Engels (1996, p. 154), analisando
os efeitos da crise do capital, levantou uma questão decisiva:
‘O que fazer com os desempregados?’ Mas enquanto se avoluma, a cada ano, o número de desempregados, não há ninguém para responder a essa pergunta; e quase podemos calcular o momento em que os desempregados vão perder a paciência e tomar o seu destino em suas próprias mãos.
Sigamos com a esperança de que um dia a classe trabalhadora tome o seu destino em suas próprias mãos!
Edna Bertoldo
Universidade Federal de Alagoas
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Referências
ENGELS, F. Prefácio da edição inglesa. In: MARX,
K. O capital: crítica da economia política. Volumes 1, livro
primeiro O processo de produção do capital, tomo 1 (prefácios e capítulos I a XII).
Apresentação de Jacob Gorender. Coordenação e revisão de Paul Singer. Trad. Regis Barbosa e Flávio R. Kothe.
São Paulo: Editora Nova Cultural, 1996.
MARTINS, J. O capital em coma induzido. Disponível em: https://criticadaeconomia.com/2020/04/o-capital-em-coma-induzido/. Acesso em: 5 de abr. 2020.
MÉSZÁROS, I. Para além do capital: rumo à teoria de transição. Trad. Paulo César Castanheira e Sergio Lessa. São Paulo: Boitempo, 2008.
[1] É o país com o maior número de contágios, com mais de um milhão (1,3) de
casos e 78.000 mortes por coronavirus. Disponível em: https://www.clarin.com/mundo/coronavirus-unidos-donald-trump-apuesta-reabrir-economia-acepta-segunda-ola-contagios_0__IbyjexiI.html.
[2] No dia 12 de maio, apresenta
um total de 169 594 e mais de 11000 mortes. Disponível em:
https://www.hispantv.com/noticias/salud/465835/brasil-eeuu-coronavirus-oms.
[3] Os dados totais no mundo, em 12 de maio, são
os seguintes: 4.292,506 contagiados e 288,975 óbitos. Disponível em:
https://www.worldometers.info/coronavirus/
[4] Nos Estados Unidos, a taxa de
desemprego em abril alcançou 14,7 %, considerada a mais alta desde a crise de
2008, com a perda de mais de 20 milhões de postos de trabalho. Disponível em: https://actualidad.rt.com/actualidad/352521-desempleo-eeuu-tasa-alta-gran-depresion-coronavirus. E segundo estimativa de Kevin
Hasset, assessor econômico da Casa Branca, em maio a taxa de desemprego poderá
chegar a 20%. É uma cifra muito elevada em comparação com a atual, que é de
14,7%, considerada a mais alta desde a crise de 1930. Disponível em: https://www.clarin.com/mundo/coronavirus-unidos-donald-trump-apuesta-reabrir-economia-acepta-segunda-ola-contagios_0__IbyjexiI.html.
[5] Disponível em: https://criticadaeconomia.com/2020/04/o-capital-em-coma-induzido/.
[6]O Congresso dos Deputados aprovou, no dia 6 de
maio, a quarta prorrogação do “Estado de Alarma”, para até o dia 24 de
maio. Com um total de 178 votos favoráveis, o governo conta cada vez mais com
menos apoio dos partidos: o Partido Popular (PP) se absteve e a Esquerda
Republicana (ERC) votou contra. Na primeira prorrogação, em 23 de março, não houve
votos contrários; a segunda prorrogação, em 9 abril, Vox e CUP votaram contra;
e na terceira prorrogação, em 22 de abril, ERC e Foro Asturias votaram contra.
Disponível em: https://www.heraldo.es/noticias/nacional/2020/05/06/congreso-prorroga-estado-alarma-coronavirus-desescalada-1373442.html.
[7] O uso da palavra brote no contexto do coronavirus na Espanha
significa surto; neste caso, o rebroto é a volta do surto da Covid-19.
Segundo o Diccionario de la lengua española da Real Academia Española
(2019), rebrote quer dizer “nuevo brote”, que pode ser entendido
como voltar a brotar.
[8] De acordo com a Organización Colegial de Enfermería,
na Espanha existe em torno de 70.000 enfermeiras infectadas. Disponível em: https://www.msn.com/es-es/noticias/espana/70000-enfermeras-pueden-estar-infectadas-por-coronavirus/ar-BB12CDpe?li=BBpmbhJ&ocid=mailsignout.
[9] Valor de uso, segundo Marx (1996, p. 297), é tudo aquilo que serve “para
satisfazer a necessidades de alguma espécie”.