Foto: Marcel Strauß |
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Silva Jardim
O homem, para se manter individualmente e enquanto espécie, precisa se relacionar com a natureza, retirar dela o seu sustento. Nessa relação com a natureza, cada homem atua em associação com outros homens, razão por que essa relação homem/natureza se dá no âmbito de uma determinada forma social que sempre surge historicamente, ou seja, que é formatada pela própria atividade humana de forma não intencional, já que os homens não “planejam” determinada forma social de se relacionar com a natureza com o objetivo de viver e de se reproduzir. O homem, assim, faz mas não sabe que faz, conforme disse Marx.
O capitalismo assim surgiu historicamente como fruto da própria atividade humana, razão por que pode desaparecer em razão dessa mesma atividade humana. E por que ele deve desaparecer? Marx viu que o capitalismo, desde os seus primórdios, produziu um grande desenvolvimento das forças produtivas humanas, do comércio, da indústria, da ciência, da tecnologia, mas também produziu uma grande miséria para as grandes massas populares, inclusive na Inglaterra, berço da Revolução Industrial.
Engels, em seu livro A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, registra que no período final da Revolução Industrial (as décadas de 1830 e 1840), podia-se encontrar crianças de 4 anos de idade trabalhando nas fábricas, mulheres e crianças realizando trabalho pesado no fundo das minas, crianças de 7 anos passando 24 horas por dia no subterrâneo. O capitalismo também produziu a escravidão dos negros africanos utilizados nas plantations de algodão na América do Norte ou de tabaco e cana-de-açúcar nas Antilhas e na América do Sul, tendo sido o escravismo moderno fundamental para a consolidação e expansão da florescente indústria européia, o que pode ser ilustrado pela produção de algodão nos EUA para uso das indústrias de fiação e tecelagem inglesas no século XIX.
É também digno de nota que nos séculos XIX e XX países capitalistas europeus conquistaram e administraram colônias a ferro e a fogo para obterem matérias-primas baratas para suas indústrias, com um alto custo humano para os povos dominados: no Congo belga morreram 10 milhões de homens, mulheres e crianças congolesas durante o reinado de Leopoldo II na Bélgica, em fins do século XIX e início do século XX. E nos Estados Unidos da América não foi diferente: a expansão para o Oeste e a consequente descoberta do ouro californiano no século XIX, tão importante para o capitalismo nessa época, foi feito sobre a base do genocídio indígena.
O capitalismo, assim, consolidou-se através da exploração de grandes massas humanas, genocídios e do saqueio de povos coloniais, em benefício de um punhado de grandes capitalistas de poucos países europeus, dos EUA e, mais tardiamente, já no século XX, do Japão. Não é desarrazoado, assim, perguntar como há quem sustente que um sistema que surgiu escorrendo lama e sangue por todos os seus poros pode ser “suavizado”, melhorado, reformado de forma a que atenda as necessidades das grandes massas populares que, já em sua origem, ele espoliou, explorou e massacrou. A mera análise empírica baseada no exame superficial dos grandes fatos e acontecimentos históricos dos últimos 250 anos, era de pleno domínio do capital, prova que, após todo esse tempo, persistem a fome, a miséria, as guerras, os genocídios e as crises humanitárias como a dos refugiados.
Mas o entendimento meramente empírico acerca da impossibilidade de reforma do capitalismo não mostra de que modo ele pode ser superado e o que colocar em seu lugar. Também não demonstra cientificamente a impossibilidade de reformá-lo e, portanto, a necessidade de destruí-lo. Daí a necessidade de que fosse produzida uma ciência que pudesse explicar o modo de funcionamento do capital. Afortunadamente apareceu na cena histórica um indivíduo genial que realizou essa monumental tarefa: este homem foi Karl Marx. Os problemas que a humanidade vive hoje, a fome, a miséria, o desemprego, as guerras, a destruição ambiental em níveis tais que espera-se a destruição de inúmeras espécies de seres vivos ainda neste século XXI, o aquecimento global que ameaça devastar as condições de sustento de inumeráveis populações humanas, tudo isso se torna explicável a partir do modo de funcionamento do capitalismo explicitado por Marx. As indestrutíveis exigências de uma sempre maior acumulação de capital, de maiores lucros a cada ano, de expansão desenfreada da produção e, portanto, do imperativo da produção pela produção e não para a satisfação das necessidades humanas, tornam o reino do capital mortífero para a humanidade e destrutivo para a natureza.
O sistema do capital conduz a tal irracionalidade e inumanidade que, hoje, em plena crise do coronavírus no Brasil, com 250 mil mortos de acordo com a contagem oficial, a vacinação se dá em passos de tartaruga e tramita no Congresso Nacional proposta de emenda constitucional do Governo Federal para eliminar a exigência de aplicação de percentual mínimo de recursos públicos nas áreas da educação e da saúde.
Marx demonstrou que a solução definitiva e satisfatória das grandes desgraças do mundo é o aproveitamento das condições materiais e culturais criadas pelo capitalismo numa forma social superior em que os homens livremente associados planejam e executam a produção de acordo com as necessidades de todos os trabalhadores. Algumas dessas condições existentes já no capitalismo são a produção cada vez mais amplamente social, a cooperação e interdependência dos trabalhadores a nível mundial, o elevado grau de tecnologia alcançado pela humanidade, a grande produtividade do trabalho, o avançado desenvolvimento científico, enfim, condições que numa forma social superior poderiam ser utilizadas racionalmente para permitir a todos uma vida digna de ser vivida porque se garantiria a nível coletivo as condições materiais necessárias à vida e o acesso pleno à cultura e à ciência produzidas pela humanidade, possibilitando ao indivíduo o desenvolvimento integral de suas capacidades e uma vida rica de significado, sem exploração de qualquer tipo e, assim, condizente com a condição humana.
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