sábado, 8 de maio de 2021

A ira do Deus-dinheiro sobre o povo negro

Foto: Chitto Cancio

 

Eudes Baima
Professor da Universidade Estadual do Ceará - FAFIDAM/UECE


       Sobre a chacina do Jacarezinho, sinto que as varias teses explicativas acabam obscurecendo o principal: o motivo é o comezinho, o de sempre. Trata-se da forma da burguesia e de seu estado de lidarem com o que consideram o dejeto social, as sobras, cada vez mais multitudinária, do funcionamento do sistema, da massa humana inútil até como exército de reserva. 

 

       Que tem, contudo, o inconveniente de estar viva, multiplicando favelas, filhos, incômodos e a violência, como único instrumento de não se deixar morrer, em face da irresistível máquina de extermínio econômico ou diretamente bélico movida com meios de estado contra ela, numa interminável “solução final”, lembrando o que disse ontem o vice-presidente Mourão por trás da indefectível máscara com o escudo do Flamengo. E, com efeito, é de uma política de extermínio em larga escala que se trata.

 

       A “sociedade de bem”, como diz o já tristemente célebre Delegado Oliveira, precisa lidar com esta massa humana restante, e não pode fazê-lo a não ser mantendo um extermínio em fogo brando e constante, eventualmente manejando as vítimas conforme os interesses dos homens de negócio (este mesmo povo fornece os peões da milícia e do tráfico, controlados por altas e obscuras rodas), com picos de violência que se tornam cada vez mais frequentes, como o do funesto dia 6 de maio.

 

       Ocioso dizer que a imensa massa humana descartada como lixo e, depois, tratada como degradação ambiental ameaçadora, é composta de homens e mulheres negros. Esta percepção elementar das motivações para a ação de extermínio de 5a feira não se opõe às causas imediatas, ação diversionista em face da CPI da Covid, ofensiva miliciana sobre território sob controle do tráfico, entre outras, plausíveis, que circulam por aí. Não parece casual que a carnificina praticada contra jovens negros, e contra toda a comunidade do Jacarezinho, tenha se passado não mais do que 12 horas depois do Presidente genocida te se entrevistado com o Governador Cláudio Castro, do Rio de Janeiro, que depois defendeu integralmente o holocausto na favela.

 

Mas nenhuma delas é razoável sem o motivo primário: a necessidade de manter sob controle demográfico as massas de mão de obra inutilizadas produzidas pelo próprio sistema, não por acaso, uma multidão de homens e mulheres negros e negras, emanada pelo racismo,  e sua prole amaldiçoada pelo Deus-Dinheiro.