quarta-feira, 23 de junho de 2021

O partido e a revolução: a concepção de Lukács

 Pensando a possibilidade concreta da revolução, Lukács reconhece que a unidade dialética ente teoria e prática, não pode constituir uma “simples consciência”, nem uma “pura teoria” e, muito menos, uma “simples exigência”; um “dever” ou “norma de ação”. A realidade do processo histórico “imprime à consciência do proletariado” um caráter “latente e teórico”, mas, que o impele a agir de forma ativa na totalidade do processo. Essa forma de consciência de classe, diz Lukács, é o partido e, nesse ponto, os problemas teórico-práticos da revolução estão diretamente ligados ao papel dirigente de uma instância que organize de forma concreta e sistemática a “vontade coletiva”.

            Nesse sentido o partido cumpre uma função decisiva na construção do processo revolucionário, pois o proletariado só se constitui enquanto uma classe para si no processo histórico por meio de uma organização de vanguarda . É nesse processo, portanto: “que o partido não pode nem provocar, nem evitar, cabe, [...] o papel elevado de ser o portador da consciência de classe do proletariado, a consciência de sua missão histórica” (LUKÁCS, 2003, p. 128, itálico no original).

Lukács afirma que Rosa Luxemburgo reconheceu logo cedo que a organização da luta revolucionária é, antes de tudo, uma consequência “do que uma condição prévia do processo revolucionário”. Ou seja, o proletariado se constitui na luta revolucionária.

Por isso, Lukács destaca que durante o “momento agudo da revolução”: “[…] o partido transformará seu caráter de exigência em realidade ativa, pois fará penetrar no movimento de massa espontâneo a verdade que lhe é imanente, elevar-se-á da necessidade econômica de sua origem à liberdade da ação consciente. Essa passagem da exigência à realidade acaba se tornando a alavanca da organização verdadeiramente revolucionária e conforma à classe do proletariado. O conhecimento torna-se ação, a teoria torna-se palavra de ordem, a massa ativa, seguindo as palavras de ordem, incorpora-se de forma cada vez mais forte, consciente e testável no nível da vanguarda organizada. As palavras de ordem corretas dão origem organicamente às condições da organização técnica do proletariado em luta” (LUKÁCS, 2003, p. 129, itálico nosso).

            Para o proletariado a consciência de classe é a sua “ética” e, sua unidade de teoria e prática. A necessidade material de sua “luta emancipadora” converte-se dialeticamente em liberdade. Pois como assinala Lukács (2003, p. 129): “Uma vez reconhecido o partido como forma histórica e portador ativo da consciência de classe, ele se torna, ao mesmo tempo, o portador da ética do proletariado em luta”.

            E isso dever determinar sua ação política. Embora, essa política nem sempre esteja de acordo com a realidade concreta imediata. Em certas circunstâncias suas palavras de ordem podem ser desconsideradas. Contudo, o desdobramento do processo da história lhe conferirá “não somente justiça”, mas também, necessariamente, “a força moral de uma consciência de classe correta” e de uma ação concreta também correta, no âmbito de uma política prática e realista.

A “força do partido é uma força moral”. E nesse aspecto, reforça a confiança das massas “espontaneamente revolucionárias” que, compelidas pelas contradições econômicas, rebelam-se. O sentimento das massas, nesse processo, é de que o partido constitui a “objetivação de sua vontade mais íntima”, mesmo que não totalmente clara para si mesma a forma de sua consciência de classe.       Com efeito, afirma Lukács: “Somente depois que o partido lutar por essa confiança e merecê-la poderá torna-se um líder da revolução”; só depois é que “o impulso espontâneo as massas” se inclinará com toda a sua energia instintiva, “na direção do partido e de sua própria tomada de consciência” (LUKÁCS, 2003, p. 130). Os oportunistas ao contrário, se fecharam a esse conhecimento, ou melhor, se fecharam “a um autoconhecimento ativo do proletariado”. A unidade da teoria e prática não se constitui só no plano da teoria, mas principalmente no plano da práxis. No mesmo sentido, o proletariado só pode atingir a consciência de classe para si ao “elevar-se ao nível de sua tarefa histórica” de superação da sociedade burguesa.

Lukács destaca que a luta empreendida por Rosa Luxemburgo contra o oportunismo e o ceticismo amedrontado em relação à revolução, representa, sem ilusões, a possibilidade concreta do proletariado engendrar a sua “emancipação econômica e política da servidão material do capitalismo”, bem como sua “emancipação da servidão intelectual do oportunismo” (LUKÁCS, 2003, p. 132).

O proletariado só pode atingir a consciência de classe para si, portanto, no momento mesmo do processo revolucionário que se efetiva no plano concreto da luta de classes que se dá no interior de uma totalidade histórica. Essa questão é entendida por Lukács como um pressuposto decisivo na construção do processo revolucionário.

 

Antonio Marcondes

GPOSSHE/UECE/GEM/UFC

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LUKÁCS, G. História e consciência de classe: estudos sobre a dialética marxista. São Paulo: Martins Fontes, 2003.