domingo, 4 de agosto de 2024

O problema da totalidade em Lukács: seu caminho metodológico V

  

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Antonio Marcondes, Pós-doutor em Educação - GPOSSHE/UECE


   No esforço de constituir uma Estética sistemática em bases materialistas, num contexto fortemente marcado pela concepção estética oficial do stalinismo, isto é, o “realismo socialista”, Lukács passa a desenvolver as ideias centrais do que seria para ele uma autêntica concepção marxista da arte. Antes o filósofo húngaro havia escrito Introdução a uma estética marxista (1957), material que seria a base teórica para a publicação de sua Estética em 1963. No transcurso histórico depois de História e consciência de classe também foram publicados Romance históricoO jovem Hegel, A destruição da razãoExistencialismo ou marxismo? dentre outros. 

     Depois do encontro com os originais dos Manuscritos de Marx em Moscou, Lukács se coloca em condições “de apresentar adequadamente, de maneira científica e marxista, aquilo que na História e consciência de classe seguia por uma trilha equivocada”. Desse modo, entendemos que apesar do estudo insuficientemente crítico de Hegel na obra de 1923, com todos os seus equívocos, ainda assim, foi o ponto de partida necessário para Lukács avançar progressivamente, agora com base em novos estudos, em direção “à tentativa de uma ontologia do ser social”. O próprio autor (e isto alenta nossos propósitos de pesquisa) deixa em aberto que não é sua tarefa “estabelecer em que grau certas tendências da História e consciência de classe, justas em sua intenção, produziram um resultado correto e orientado para o futuro”, de sua atividade  (LUKÁCS, 2003, p. 47-50, itálico no original). Com base nisso, afirmamos inicialmente, que a categoria da totalidade em História e consciência de classe constitui, a despeito de sua dupla determinação metodológica, a categoria que representará o ponto de partida para Lukács avançar continuamente (de forma mais consciente a partir da “virada ontológica” da década de 1930) em direção à adequada fundamentação do método de Marx e suas determinações categoriais plenamente materialistas, ontológicas. Isso será decisivo para a autêntica apropriação do marxismo.

     Portanto, a passagem progressiva que Lukács realiza em direção a sua obra de maturidade, representa um sério e gigantesco esforço intelectual na tentativa de desenvolver a herança teórica, cultural e científica de Marx. Isso, efetivamente será consolidado na Ontologia do ser social. Esta obra póstuma e inacabada foi o último trabalho no qual o filósofo húngaro se dedicou até seu falecimento em 1971. A Ontologia fora originalmente concebida como uma introdução a uma Ética, mas tal foram suas proporções, demasiadamente amplas, que acabou tornando-se uma obra autônoma. Em suas volumosas páginas[1] divididas em dois volumes na edição brasileira, Para uma ontologia do ser social de Lukács publicada originalmente em húngaro em 1976, em italiano a primeira parte em 176 e a segunda em 1981 e no alemão a edição integral é de 1984[2]. Nesta obra Lukács vai haurir a partir das formulações do próprio Marx uma profunda investigação sobre o que seriam os fundamentos ontológicos decisivos do ser social, ou seja, a partir de Marx, Lukács desenvolve um conjunto de reflexões histórico-sistemáticas que visam estabelecer em sentido ontológico, “a determinação histórico-concreta” das peculiaridades do ser social e de sua reprodução. 



[1] Na edição da Boitempo (2012, 2013): Vol. 1, 431 páginas e o vol. 2, 842 páginas, respectivamente.

[2] Ver José Paulo Netto na apresentação do volume 1 da Ontologia de Lukács pela edição da Boitempo, 2012.